Entra em vigor lei que regulamenta o contrato de “Built To Suit”

Por Daniel M. Boulos e Elie Pierre Eid

Em 19 de dezembro de 2012, entrou em vigor a Lei 12.744, que altera a Lei 8245/91 (conhecida como “Lei de Locações”) para modificar a redação do artigo 4º e, ainda, acrescentar o artigo 54-A.

Essa alteração legislativa em nosso ordenamento, disciplina, pela primeira vez, o denominado contrato de “built to suit” que consiste, em resumo, “(..) de um contrato por meio do qual uma das partes (empreendedor, locador) compromete-se a adquirir um terreno e a nele construir um determinado prédio ou empreendimento que, em seguida, será locado à outra parte (locatário). O empreendedor adquire o terreno e constrói o empreendimento de acordo com os interesses e com as instruções fornecidas pela outra parte, que irá posteriormente locá-lo. Esse é o traço fundamental que caracteriza o contrato: o fato de o terreno e a construção que nele será feita atenderem, de forma especial, seja no que se refere à localização, seja no que tange às suas características, a parte que posteriormente irá locá-lo. Diferentemente do que ocorre no contexto do típico contrato de locação, o valor mensal pago pelo locatário ao empreendedor, além de corresponder unicamente à remuneração pela cessão da posse de determinado bem, também visa proporcionar ao empreendedor os recursos necessários para que haja o retorno do grande investimento inicial que ele efetivamente fez.” (Daniel M. Boulos, em artigo publicado no Jornal Valor Econômico em 2008).

A ausência de disciplina legal específica, a pouca apreciação judicial da matéria pelos nossos tribunais e, ainda, a pouca discussão doutrinária existente, fazia do contrato de “built to suit”, até poucos anos atrás, um contrato interessante, do ponto de vista prático, mas em certa medida “perigoso”, relativamente à segurança jurídica das partes que dele participam.

Esse cenário, no entanto, vem sendo modificado gradativamente, seja com a publicação de estudos doutrinários (acadêmicos e jornalísticos) acerca do tema, seja em razão de recentes decisões, por exemplo, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Essa evolução na compreensão do “built to suit” foi, agora, coroada pela entrada em vigor da Lei 12.744 que, ao menos, traz luz a alguns aspectos importantes dessa operação – tão comum quanto interessante, no mercado imobiliário.

Em primeiro lugar, a modificação promovida na redação do artigo 4º da Lei de Locações deixa claro que, nos contratos de “built to suit”, não há que se falar, em caso de término antecipado do contrato, em proporcionalizar o valor da multa prevista no contrato.

Por outro lado, a redação do artigo 54-A, indica que, na locação “(…) em que o empreendedor adquira, construa ou reforme substancialmente, por i ou por terceiros, o imóvel indicado pelo pretendente à locação, locando-o por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos respectivos(…)”.

Foi reconhecido, portanto, que as relações jurídicas provenientes dos contratos de “built to suit” são de cunho civil, regulada por estes mencionados artigos da Lei de Locações (e pelo Código Civil), mas não submetida ao regime protetivo que a referida Lei de Locações dispensa ao locatário.

Outro ponto favorável da Lei, que recentemente entrou em vigor, é a previsão, no parágrafo 1º, do artigo 54-A, de que “poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação”. Essa disposição pretende, com acerto, resolver dúvida, até então existente, acerca da possibilidade ou não de o denominado “locatário”, nos contratos de “built to suit”, fazer uso da “ação revisional” (artigo 68 e seguintes, da Lei de Locações) ou, por outro lado, se seria válida a renúncia – em cláusula contratual expressa – à utilização da ação revisional.

Entendemos que, também neste ponto, a Lei é benéfica porquanto se afigura absolutamente contrário à lógica jurídica e econômica do “built to suit” que o denominado “locatário” possa pleitear em juízo a modificação do valor do “aluguel”. O “aluguel”, nestas operações e nos respectivos contratos, representam, em realidade, o retorno financeiro que o empreendedor ou investidor (denominado “locador”) aufere, não só pela cessão onerosa da posse do imóvel ou da construção (como, ordinariamente, ocorre nas locações típicas), mas, também, de todo o investimento por ele efetuado, especificamente para atender aos interesses do “locatário”.

Não fosse, com efeito, o interesse do “locatário”, o “locador” não teria adquirido e/ou construído e/ou reformado o imóvel, sendo certo que, o investimento por ele efetuado, a esse título, deve ser remunerado.

A mesma lógica poderá ser aplicada à possibilidade de o “locatário” denunciar (terminar) antecipadamente o contrato de “built to suit”. Nas locações tradicionais, o locatário possui o direito de, a qualquer tempo, colocar fim ao contrato de locação, pagando, ao locador, multa prevista no contrato, proporcionalizada de acordo com o tempo que restaria para o fim da locação. A proporcionalização do valor da multa, neste sentido, constitui um direito do locatário.

O mesmo não pode ser dito quando se considera que o contrato é de “builto to suit”. Como o investidor (“locador”) tipifica, customiza, adapta, o imóvel aos interesses e necessidades específicos do denominado “locatário”, afigura-se absolutamente injusto possa esse colocar fim antecipadamente ao contrato e, ainda assim, proporcionalizar o valor da multa contratualmente prevista. O valor do “aluguel”, no “built to suit”, representa a remuneração do “locador” pela cessão onerosa da posse do imóvel e, ainda, por todo o investimento por ele efetuado para adquirir e/ou reformar e/ou construir o (ou no) referido imóvel. O valor do “aluguel” é compatível, assim, com o tempo de duração do contrato. Menor fosse o tempo, maior seria o valor do “aluguel”.

Em razão disso, também nos pareceu bastante adequada a previsão contida no § 2º, do artigo 54-A, da Lei ora comentada, segundo a qual “em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o término final da locação”.

Do que foi exposto, conclui-se que, a despeito de tímida (na medida em que outros aspectos do “built to suit” poderiam ter sido abordados), a Lei 12.744/2012 é benéfica para que a operação de “built to suit” possa continuar a ser utilizada pelos agentes econômicos que atual no mercado imobiliário.

Consulte o texto integral da Lei n.º 12.744/2012.

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